As aulas de gramática não eram minhas favoritas. Pareciam-me
uma perda de tempo. Afinal nós já sabíamos falar e escrever e uma aula para nos
ensinar a fazer isso parecia meio sem propósito. É evidente que a razão
principal era outra. Gramática era trabalho duro. Muitas regras a decorar,
definições, conjugações… isso sim era a razão para não gostar das aulas. A par
de matemática eram as aulas menos apetecíveis. Mas na verdade eram importantes
e úteis. Não entendia nessa altura mas gramática tinha a ver com a qualidade de
comunicação. Falar e escrever bem eram atributos que nos acompanhariam toda a
nossa vida e eram essenciais ao nosso contato com as outras pessoas.
A gramática também nos ajuda na vida Cristã. Muitas das
importantes descobertas sobre a vida que devemos viver em Cristo vem pela
analise das palavras do texto sagrado. Entender essas palavras e sua categoria
gramatical e sua utilização pode fazer toda diferença em nossa aplicação. E é
de aplicação que se trata a vida em Cristo porque saber sem fazer não tem
qualquer utilidade a não ser nos colocar na fila perigosa dos que caminham em
direcção a hipocrisia e falsidade.
Amor é uma dessas palavras. Como se deteriorou. A Bíblia nos
fala de amor eterno, amor sofredor, amor altruísta e nós hoje falamos de amor
para nos referirmos a algo que é passageiro, profundamente egoísta, abusador e
maltratante. Deve haver engano em algum lugar. Alguém, em algum lugar perdeu a
noção do que é amor e passou a usar a palavra de modo errado. Usemos então a
gramática. Lembremos o que Jesus nos disse sobre o amor e vejamos se a
gramática pode nos ajudar.
João 15:12 amarmos uns aos outros na igreja (amar os irmãos
em Cristo)
Mateus 22: 39 amar o próximo (meu vizinho, meu colega de
trabalho)
Mateus 5: 44 amai os vossos inimigos (meus adversários, que
me fazem mal)
Uma progressão difícil. SE temos por vezes dificuldade em
amar aos nossos irmãos na igreja onde há em teoria a mesma fé e a mesma pratica
como amarei meus adversários? Do que Jesus estava falando quando deu esses mandamentos?
Vejamos sem a gramática nos ajuda. Olhemos para as diferentes possibilidades da
palavra e pensemos em soluções.
Substantivo:
palavra que designa ser, coisa, estado, sentimento, substancia ou processo.
Será o amor que Jesus fala substantivo? Ora um substantivo é algo sobre o que
podemos conversar, discutir. Sobre ele fazemos poemas, discursos, trabalhos
científicos. O substantivo é uma designação de algo que por regra podemos
observar fora de nós. Pode ser usado ou descartado. Cadeira, substantivo que
designa um objecto onde me posso sentar ou apoiar os pés para amarrar os
sapatos ou subir em cima para apanhar algo no armário de cima e que posso
deitar fora porque já não preciso mais pois tenho outra mais nova, mais forte,
mais bonita. Amor substantivo, algo que posso sentir por alguém ou nutrir por
alguém enquanto durar… O amor substantivo é realmente pouco duradouro. Não é
realmente parte de mim pois posso descartá-lo. Amor substantivo é como um
objecto que posso usar e deitar fora, que ponho aqui ou acolá, que carrego ou
deito fora, que utilizo e reutilizo, reciclo e altero, algo que é passível de
manipulação constante. É algo sobre o que discutimos e debatemos. Falamos dele
como algo exterior e passível de discussão. Discorremos sobre ele e depois já
não mais. Não me parece que seja sobre isso que Jesus falava.
Adjectivo:
palavra que serve para se juntar ao substantivo e o classificar ou qualificar.
O amor pode ser um adjectivo. Dizemos de alguém: é um amor. Trata-se de uma
utilização mais comum para bebes ou para atitudes meio lamechas que assistimos
ocasionalmente. Alguém diz algo bonito ou faz um gesto carinhoso e dizemos: é
um amor. Falamos de alguém a quem queremos elogiar e dizemos: é um amor. Classificamos
com amor. Mas essa utilização além de rara é totalmente subjectiva. Aquilo que
pode ser um amor para uma pessoa pode ser absolutamente sem graça para outra.
Algo que alguém vê como precioso pode ser totalmente sem sentido para outra
pessoa. Por exemplo, nos países de leste é comum se darem flores a homens e
seria considerado muito correto e mesmo um amor. Já em Portugal, no nosso mundo
latino, macho não recebe flores e se receber é capaz de comentar de muitas
formas mas não dirá que foi um amor. Adjectivar é um ato pessoal e subjectivo e
creio que Jesus falava de amor como algo inequívoco, sem sombra de dúvida,
universal e aplicável a todas as pessoas em todos os lugares. O amor do qual
Jesus falava não era amor adjectivo.
Verbo: palavra
que afirma existência de uma acção atribuída a um sujeito; exprime um fato e
localiza-o no tempo ligado a um sujeito. Verbo é acção. A Bíblia diz que Deus
amou tanto que deu… amor ligado a um ato, a uma acção, a um fazer. Não é algo
que se pode discutir ou debater. Ou existe ou não. Um verbo por ser acção não é
ambíguo, não é subjectivo, não é passível de má interpretação. Ou fez ou não
fez, ou deu ou não deu, ou aconteceu ou não aconteceu. Na Palavra, amor para Deus
sempre foi verbo. Ele amou, por isso criou, delegou, ajudou, salvou, livrou,
protegeu, abençoou. Quando Paulo falou sobre amor falou sobre algo prático,
definiu acções, orientou actos.
Na vida Cristã somos chamados a amar um amor verbo. Pode ser
sentimento, mas não é só sentimento, pode ser qualidade, mas é mais que isso.
Trata-se de agir. De fazer o melhor para outro. Esse tipo de amor pode ser dado
e demonstrado mesmo por um inimigo a quem não aprecio e de quem não tenho
sentimentos muito bons. Posso amá-lo biblicamente mesmo assim. E nos atos de
amor prático meu coração será transformado e talvez até mesmo o dele. Jesus
deixou isso bem claro, em sua passagem sobre o fazer aos mais pequeninos em
Mateus 25:34 a 40. Este é amor verbo. Este é o amor do Pai. Este é o amor que o
Senhor espera de nós.
Nenhum comentário:
Postar um comentário