Eu vou para o trabalho de transporte público, nomeadamente de comboio. Sou utilizador da Linha de Sintra desde os idos de 1985, quando entrei na Faculdade de Medicina e vim estudar para Lisboa. Morava na Amadora e ia de comboio para a faculdade, como vou hoje para a clínica onde trabalho.
Que mudanças aconteceram de lá para cá? Muitas! Há mais comboios e são melhores dos que os do meu tempo de faculdade. Há mais estações e mais ligações a autocarros e metro. A mobilidade melhorou. Os comboios continuam cheios como antigamente, mas agora têm ar condicionado, quando não está avariado e funcional nos horários, quando não há greve. Ou seja, do ponto de vista do transporte público eu diria que houve melhoria nesses 30 anos. Porém, as diferenças mais significativas estão nas pessoas. Mais que as estações e os comboios, mudaram as pessoas.
Nos meus tempos de faculdade os comboios eram lugar de conversa e, por vezes, debate. Havia gente a falar de futebol e política, como sempre, mas também da casa, dos filhos, do trabalho. Havia até quem jogasse às cartas durante o trajecto até ao Rossio, que era um modo de passar o tempo mais animadamente. Agora o comboio é um local para se estar no telemóvel. O omnipresente telemóvel.
Alguns a falar, outros a mandar mensagem, mas, sobretudo a usarem o aparelho para as outras coisas que ele faz. Ouvir música, jogar joguinhos viciantes, ver as notícias, assistir clips e até séries de TV ou filmes. A consequência desta mudança foi que acabou a comunicação pessoal. Hoje é mais fácil falar com os outros detrás de um ecrã e não presencialmente. Criar um perfil que me agrade, e pode ser bastante diferente da realidade, assumir opiniões e até ofender descaradamente por trás de um nome falso, mas sobretudo ficar longe, deixar de realmente comunicar.
As novas gerações, e as antigas por arrasto, estão a perder a capacidade de se relacionar. Contabilizam amigos no facebook e os likes nos seus vídeos e postagens para avaliar assim a sua popularidade. O que está na moda é ser youtuber e ganhar dinheiro fazendo vídeos sem sair de casa e sem se relacionar com ninguém.
Mas nós fomos criados para viver em comunidade. Foi o próprio Deus que declarou que não era bom que o homem estivesse só e que criou o casamento e a família. Hoje vemos famílias reunidas em locais públicos com cada elemento a comunicar no telemóvel, sem olhar ou falar com os outros.
Como cristão meu alvo de vida é ficar mais parecido com Cristo. E não consigo evitar perguntas como: será que se Ele vivesse hoje em dia teria Instagram? Usaria o facebook? Comunicaria via youtube? Sabemos que o Senhor era um comunicador maravilhoso e gastou seu tempo de ministério público a falar e ensinar além de fazer sinais e curas. Mas, quando olhamos mais de perto para seu ministério percebemos que Ele valorizou sobretudo a relação mais próxima. Não é por acaso que quando terminou sua obra e se preparava para voltar ao Pai Ele nos mandou “fazer discípulos”. Ora, não se faz discípulos pelo Instagram ou pelo facebook. Nada substitui a ligação presencial essencial, e o quanto mais regular melhor.
Como Igreja de Jesus temos a responsabilidade de saber usar as oportunidades que vão surgindo. No tempo de Lutero a grande novidade da tecnologia de comunicação era a imprensa. De repente era possível copiar as suas mensagens e fazer panfletos as centenas e mesmo milhares e a reforma foi bem-sucedida na utilização desse recurso para alcançar muita gente e fazer a diferença. Parece um bom exemplo a seguir. Devemos fazer uso sábio dos novos recursos e utilizá-los para alcançar aqueles que de outro modo não ouviriam.
Mas que isso não nos leve a pensar que o ministério da igreja é para ser online. A ligação pessoal, a relação próxima, a partilha de vidas, lutas e bênçãos precisa ser direta e presencial. Temos que ser obedientes ao mandato do Senhor e fazer discípulos, ajudar uns aos outros a crescer na fé e alcançar para Cristo aqueles que não o conhecem. O mundo, cheio de tecnologia de comunicação, nunca viveu uma crise de relações como hoje. As pessoas não tem amigos de verdade, não tem quem os ouça e precisam pagar a profissionais para poder simplesmente ter quem escute suas angústias. É uma oportunidade única para a igreja ser Igreja, corpo de Cristo, seus ouvidos e boca num mundo sedente de relações genuínas.
Não posso afirmar que Jesus teria ou não Instagram, mas sei que Ele certamente não ficaria a ministrar por trás de uma câmara e dependente de um ecrã. Sejamos sábios no uso dos novos recursos, mas não nos deixemos levar pela onda moderna e sejamos fieis à ordem do Mestre de fazer discípulos e ser bênção.
Joed Venturini
2 comentários:
Excelente, a falta de comunicação é uma grande e triste verdade. Obrigada, pastor Joed Venturini.
EXCELENTE MENSAGEM. É TRISTE O QUE DESCREVE. OBG. PASTOR JOED. ABRAÇO. GUILHERMINA CORREIA - AMADORA.
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