A Dúvida Honesta do Crente


A aula está prestes a terminar e o professor faz a pergunta chave: alguma dúvida? O silêncio que se segue não é indicador da falta de dúvida, mas sim da vontade de terminar logo a aula e seguir para o intervalo. Os alunos suprimem as dificuldades e o professor faz de conta que acredita. A aula acaba e todos parecem satisfeitos. Mas a pergunta ainda ecoa: alguma dúvida?
Dizer que não temos dúvidas é mentir. A dúvida nos acompanha todos os dias de múltiplas formas. Há a dúvida banal como querer saber a hora, se vai chover ou quando passa o próximo transporte que preciso usar. Há a dúvida interesseira como saber o que há para o almoço. Há a dúvida vaidosa como pensar no que vou vestir. Há a dúvida existencial e global de saber quem somos e o que fazemos neste mundo. Mas dúvidas não faltam.
Na vida cristã a dúvida também esta bem presente. O cristão que diz não duvidar não está na verdade fazendo uma boa afirmação de sua fé mas de sua falta de avaliação e raciocínio. Pensar é duvidar. Viver é passar por dúvidas e o crente mais sincero e fiel as teve como podemos encontrar em todos os capítulos da história bem como no AT e NT. A dúvida honesta não é o contrário da fé, mas pode até ser a melhor maneira desta crescer. O que a Bíblia nos fala sobre a dúvida? Que tipos de dúvida encontramos na escritura e como lidar com elas?
Dúvida Obstinada
Comecemos pela pior forma de dúvida mas que existe em todos os lados – a dúvida obstinada. Um bom exemplo é o que encontramos em Mateus12:38. Os fariseus e seus acólitos pedem um sinal a Jesus com a desculpa de que se ele mostrar mais um sinal talvez possam crer que ele é o Messias ou pelo menos um profeta especial como aparenta ser. Mas a dúvida deles era obstinada. Convencidos de sua superioridade, desprezando Jesus por sua criação galileia e seu sotaque de interior, negando sua sabedoria apenas com base nem sua falta de treino académico, os fariseus não queiram crer.
Durante meses e mesmo anos seguiram Jesus. Estudaram sua vida, suas palavras e viram seus milagres. Presenciaram coisas inauditas e ficaram sem saber como responder. Juntaram as mentes mais brilhantes a fim de o desmascarar e fazer cair. Montaram armadilhas as mais espertas com o intuito de o derrubar. Tudo em vão. A vida de Jesus era limpa, sua memória inatacável, seu procedimento o mais correto, sua sabedoria inigualável, seus milagres abertos, claros e sem questionamento possível. Conclusão: dúvida obstinada. Eles não queriam crer.
Talvez o momento mais marcante seja a ressuscitação de Lázaro. O que poderia ser mais conclusivo que o morto sair da sepultura depois de 4 dias? Não seria a prova final? O momento da mudança de mente? Mas quando viram o milagre dos milagres, o Senhor da Vida em pleno, então é que fecharam mais ainda seus corações e tomaram a firme decisão de o matar. Se não podiam derruba-lo então o matariam. A dúvida que tinham sobre Jesus não era solucionável porque era obstinada, permanente e sem remédio. Era a blasfémia conta o ES, o pecado sem salvação.
Hoje temos essa posição ganhando muitos adeptos. As respostas bíblicas e cristãs às questões da vida nunca foram tão acessíveis. A quantidade de mentes brilhantes que adotaram a fé e que a defendem nas mais variadas áreas do conhecimento humano é inigualável em termos históricos. Nunca tivemos tantos crentes de formação superior elevada e em posições tão importantes, mesmo nos organismos e instituições mais reconhecidos do mundo. Da filosofia à física, passando pela medicina e genética, cristãos têm respondido às questões levantadas contra a fé de forma credível, séria e sistemática e no entanto os ateus aí estão. Alguns filosoficamente firmes, outros apenas seguros em sua ignorância e com perguntas gastas e cansadas, mas que não serão respondidas por uma razão simples: eles não querem saber!
Diante da dúvida obstinada e sistemática, a dúvida pela dúvida, não há muito que possamos fazer. Nem o Senhor pode vencer aqueles que não querem crer porque simplesmente não querem. Sua dúvida não é racional, é muito mais emocional e sem dúvida volitiva. Não há como ultrapassar. Sendo assim o mais que podemos fazer é orar, esperar e acreditar que enquanto há vida há a esperança de que algo na vida ajude esses duvidosos a abrir a mente para as evidências.
Dúvida pela Impossibilidade
Um tipo de dúvidas mais aceitável e também comum é a dúvida pela impossibilidade. Exemplo bíblico bom seria Zacarias em Lucas 1:18. Fazendo eco da dúvida de sara no AT, o velho sacerdote não conseguiu aceitar facilmente que sua esposa já idosa pudesse ser mãe. Algo semelhante aconteceu com maria quando questionou o anjo sobre a impossibilidade de engravidar sendo virgem. 
Esta dúvida não é maldosa e nem renitente, é apenas lógica. Como pode acontecer algo que contraria as regras? Como acontecer algo que nunca foi visto antes? Há o que se pode esperar. Há o que é comum, o que é frequente e depois o que acontece pouco e raramente. Mas se nunca aconteceu, se é a 1ª vez, a dúvida se instala. Será possível?
A dúvida da impossibilidade, no entanto, é repreendida no caso de Zacarias e em outros casos (a dificuldade dos discípulos em aceitarem a ressurreição de Jesus por exemplo). O Senhor não esta limitado por nada. O tempo para Ele não existe e a matéria é totalmente manipulável. Nada é impossível para Deus. Jesus curou todas as doenças, andou sobre as águas de u mar tempestuoso, transformou água em vinho e multiplicou 5 pães e 2 peixes para mais de 10 mil pessoas. O que é impossível para nós é banal para o Deus que é todo-poderoso. Além disso, devemos lembrar que todos os dias acontecem coisas que nunca tinham acontecido antes. Todos os dias há uma 1ª vez de algo. Logo, tudo é possível no reino de Deus e nas mãos do Senhor. A questão para Deus nunca é de possibilidade mas de vontade já que Ele em sua santa e sábia vontade sabe o que é melhor, quando e como acontecer.
Dúvida que surge da Mágoa
Mas o tipo mais comum de dúvida na vida do crente é aquela que surge da mágoa. É a dificuldade de entender o que esta a acontecer que leva a questionar o poder, o amor, a presença interessada de Deus. Um bom exemplo disso será o de João Batista conforme lemos em Lucas 7:18. João tinha vivido uma vida justa, uma vida digna, uma vida consagrada a Deus. Fora profeta e segundo o próprio Jesus fora o maior de todos. Não temera nada nem ninguém em sua proclamação arrojada da necessidade de arrependimento. Mas embatera justamente com o homem mais perverso da terra – Herodes.
A família de Herodes era famosa pela ganancia do poder e pela vida desregrada. Herodes pai, chamado o Grande, governara a Judeia toda sob autorização romana e vivera obcecado com a paranoia de um golpe de estado. Matou esposas e filhos nessa obsessão. Ao morrer deixou filhos fracos que não conseguiram manter o poder. Seu filho Herodes Antipas acabou por governar só a Galileia na partição quadrupla da terra, daí ser chamado o tetrarca. Entre suas falhas de carácter estava a de ter seduzido a esposa de seu irmão Filipe, de nome Herodias, que era simultaneamente sua sobrinha. João não se intimidara e falara contra tal união incestuosa e maligna. Herodes o mandou prender na fortaleza de Machaerus a alguns quilómetros do mar morto, numa colina da Pereia uma das residências de férias dos Herodes.
E agora que João estava preso. Como explicar isso sendo Jesus o Messias? Ele que era seu primo, que conhecia tão bem as histórias de seu nascimento e do nascimento de Jesus. Ele que dera testemunho de Cristo ao mundo e que o mostrara como o messias, agora duvidava. Estava preso há cerca de 1 ano e sem saída. Na prisão, em agonia, as dúvidas começavam a chegar. Seria afinal engano? Seria Jesus o messias na verdade? Seria possível que o justo passasse por tudo aquilo? Como Elias um dia, duvidou mas em grande parte porque esperou algo diferente do que Deus prometera. Como entender isso? Como aceitar isso? Não era Jesus o Messias? Esse tipo de mágoa que seria natural em João era também eco de uma expectativa errada.
Outro episódio que nos leva a dúvida pela mágoa é o de Tomé que temos em João 20:23. Temos a tendência de criticar Tomé e temos algumas razões para isso mas também devemos no colocar em seu lugar. Ele vira Jesus fazer coisas incríveis por 3 anos. Durante todo desde tempo criara junto com os outros uma expectativa enorme em relação ao que Jesus seria e faria e de repente, justamente na semana em que tudo se conjugava para um sucesso tremendo, eis o golpe, eis a surpresa macabra. Jesus preso, condenado, crucificado. Como vencer essa mágoa? Como ultrapassar a morte do mestre? Como entender e explicar que o messias deles tinha sido torturado até a morte de forma tão cruel. E a mágoa era tanta que quando chega a notícia de uma ressurreição ele não pode crer, não consegue crer, age com total incredulidade e declara com petulância: só se eu vir e tocar. Dúvida sincera, de quem crera e queria crer mas cuja mágoa era grande demais para facilitar.
Outra forma da dúvida ou causa comum dela nesses momentos de mágoa é a dúvida que surge de expectativas erradas. Um bom exemplo será o dos discípulos no caminho de Emaús em Lucas 24:21. Eles não conseguiam crer na possibilidade da ressurreição, descartavam o testemunho das mulheres e seguiam profundamente desanimados. Mas além da mágoa pela morte de Jesus a razão principal de sua dúvida e dificuldade estava na frase “nós esperávamos”. A sua expectativa de um messias com características políticas, militares e governativas tinha criado uma atitude mental que não possibilitava a morte de Jesus e não entendia a sua ressurreição. Esperavam algo que o Senhor não prometera. Na verdade, até esperavam algo que era contrário as profecias e ao que o próprio Jesus já tinha dito e isso os colocava em rota de colisão com a realidade.
Uma das razões porque Jesus encontrou tanta fé fora de Israel, como no caso do centurião romano ou da mulher cananeia, era que eles não tinham essas expectativas erradas a respeito de um messias. Não esperavam nada. Não contavam com nada e por isso acabavam tão maravilhados com Jesus. Sua fé era simples e sem esperanças falsas e se entregavam sem limitação por isso mesmo.
Em todos esses casos de dúvida pela mágoa e pelas expectativas erradas Jesus se mostra compreensível e sua resposta tem a ver com a nossa necessidade de estar mais perto do Pai. Aos discípulos de Emaús ele explica a escritura, a João ele manda um relato do que está a acontecer e a Tomé ele aparece em pessoa. O que falta nessas horas de dúvida é chegar mais perto, confiar que quando não entendo, o seu amor não diminuiu e que a esperança nele é sempre renovada.
Dúvida Honesta do Crente
A Bíblia não nega assim a dúvida na vida do crente e até a aceita como natural mas não deixa de nos mostrar como encara-la. Talvez a melhor maneira de lidar com a dúvida seja reagir honestamente como aquele homem que levou seu filho endemoninhado para Jesus curar. Encontramos suas palavras marcantes em Marcos 9:24. Provavelmente mais que todos os demais, este episódio nos ajuda mais que qualquer outro no entendimento da dúvida honesta do crente.
Este pai passara por várias fases no caminho da dúvida. Primeiro a dúvida da incredulidade: isso não pode estar a acontecer bem na minha família. Depois a dúvida da cronicidade pois os ataques se sucediam e nada os parava e a vida se tornara um inferno. Então a dúvida da desilusão magoada, os discípulos nada tinham conseguido. Não eram eles os discípulos de Jesus? Não tinham recebido dele o poder? Será que esse Jesus era só conversa? Seria ele como os outros que o tinham enganado?
Mas ele quer crer. Sabe que sua fé é pequena mas está desesperado. Resta só um pouco de esperança e sem querer sua boca acaba mostrando seu coração “se puderes” e Jesus o questiona: se? Que fé é essa? Que tipo de pedido é esse? Você duvida diante do Senhor da vida? Como quer ajuda com essa atitude? E o homem humildemente, sem querer perder a bênção, sem poder corrigir o que já mostrou de seu coração clama: eu quero crer, mas sou fraco, eu creio, mas com uma  fé microscópica, Senhor tenha misericórdia e ajuda a minha fé, entende a minha dúvida, auxilia a minha incredulidade. E a maravilha é que Jesus faz exatamente isso – Ele cura o menino.
O crente honesto terá que reconhecer momentos de dúvida. São humanas, são quase impossíveis de evitar. Por vezes sentiremos mesmo que nossa fé não está a altura das circunstâncias.
Lembre-se: o amor do Senhor não muda; Seu poder não se altera; Sua sabedoria sabe o melhor; Sua soberania controla e providencia.
Entregue seu coração com sinceridade, abra sua alma e ore com paixão: eu creio Senhor, ajuda a minha pequena fé!

 

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